sexta-feira, setembro 11, 2009

"Dia mesmo não" ou "preciso mesmo de desabar isto"

Hoje acordei com os "pés de fora". Tive um sonho que mais parecia um pesadelo (desde criança que eu me lembro quase todos os dias do que sonhei, mas isso é assunto para outro post). Estou nervosa, irritável e chorona. Para melhorar o estado, fui falar com a educadora da Mariana (parece que não tinham percebido que a criança não pode dormir mais do que meia hora na sesta da tarde, senão à noite não tem sono). Como estavam expostos desenhos do primeiro dia de aulas (tema: férias), decidi procurar o da Mariana. Todos tinham uma ou duas figuras humanas desenhadas, com uma flor ou uma casa, excepto o da Mariana. Ela anda na fase de desenhar figuras humanas, mas também de preencher os desenhos com outros elementos. Pois bem, o desenho dela, para além duma casa que se percebia bem, estava cheio de flores, animais e outras coisas que só ela consegue decifrar. Problema: a educadora dela não é muito sensível à diferença. Infelizmente ela já passou por uma situação muito desagradável por causa de ser diferente no comportamento. Como é uma criança muito tímida foi a certa altura apelidada de "imatura". Mais tarde passou a "imatura socialmente" e depois a "criança muito doce". Quando é apenas tímida e ponto final. E quando as educadoras estão lá para a estimular nesse sentido. Quero lá eu saber se ela sabe os números, se escreve algumas palavras, se consegue contar e fazer algumas contas. Tem tempo. Acabou de fazer 4 anos. E sinceramente, eu tal como ela, também fazia contas aos 4 anos, sabia letras e números, etc. Sou mais feliz por isso? Não. Antes pelo contrário.
Nós pais queremos que os nossos filhos nasçam a andar, a falar e a contar. Também cometo muitas vezes esse erro. Depois "caio em mim" e penso naquilo que sou hoje e no que já fui. Uma criança sempre preocupada, (super)exigente comigo e com os outros. Incapaz de pensar em errar. Com dificuldades em lidar com a frustração. Transformei-me numa adulta ainda mais perfeccionista. Ansiosa. E quando olho para a minha filha mais velha, revejo-me nalguns traços. Que não quero que ela tenha. Pode herdar de mim a vontade de viver, a felicidade que encontro mesmo nas pequenas coisas, a inocência, a vontade de querer sempre o melhor para os outros, mas nunca a faceta de querer sempre mais, de andar sempre a mil, de viver amedrontada com determinadas coisas. Quero uma criança que brinque muito e não seja um adulto em miniatura. Como eu sempre impus a mim própria. E é isso que tenho tentado fazer na educação delas. Tudo tem o seu tempo e eu tenho tentado respeitar isso.
Mas voltando aos desenhos. Eu conheço muito bem a educadora dela. Sei que ela deve ter olhado para o desenho dela e mais uma vez a deve ter discriminado. O desenho está bonito. Colorido. Cheio. À maneira dela. Não é esse o problema. É a diferença. Que infelizmente não é muito bem aceite por nós. E eu não quero fazer uma tempestade num copo de água, mas também não quero que se passe, como aquando daquela situação de chamarem imatura à Mariana, só porque ela é tímida. Depois disso, com uma distinta "lata" disseram-me: "Sabe mãe, a Mariana já está muito melhor. Temos andado a puxar mais por ela e já anda mais confiante, mais alegre. Como ela estava sempre tão caladinha, nós achávamos que ela estava bem e se calhar desprezámo-la um bocadinho."
Ou seja, a minha filha, que em casa é um poço de alegria, de sorrisos e boa disposição, lá era completamente diferente. Parece que só na dança criativa é que ela saltava, dançava e sorria. A professora da dança até disse à educadora que a Mariana era das meninas mais alegres que conhecia. E porquê? Porque adora dançar. Sente-se no mundo dela. Tal como em casa.
E eu vir a saber que ela durante o primeiro período foi desprezada, foi muito duro. Chorei muito, naquela noite. Escrevi uma carta à educadora, para ser contida nas palavras e não dizer tudo o que me apetecia dizer-lhe. Telefonei a pedir uma reunião. Até a directora da escola veio falar comigo e assinou a carta que eu tinha escrito. Foi grave. Muito grave. Passaram a tratar-me doutra maneira. Que não me deixou mais confortável, porque não gosto de ser apaijada. Mas pelo menos começaram a estimular a Mariana a fazer recados, a participar mais, a perder receios e timidez. Aquilo que sempre deviam ter feito a uma criança de 3 anos que se revela tímida. Alguém que percebe destes assuntos me dizia que timidez não é melhor nem pior que extroversão. Mas o que interessa é que ela passou a sorrir mais, lá. Embora sempre tenha gostado de lá estar, de repente passou a sentir-se em casa. E notou-se essa diferença em muitas reacções. E como é que uma mãe reage quando se apercebe que a filha foi desprezada? Não sei. Mas eu reagi assim: chorei. Mais tarde revoltei-me. Perdoei mas não esqueci. E ao mínimo pormenor, tenho uma "recaída". Vê-la ao colo da educadora, enquanto ela lhe dava mimos, não foi fácil para mim no início. Parecia-me fingimento. Mas o tempo cura tudo. Sim. Fui esquecendo e hoje até já consigo falar disso.
Mas assalta-me o medo que se volte a repetir-se a situação. A minha filha passa lá muitas horas e quero muito que esteja bem. Acima de tudo, educo-a para a felicidade. Venha essa felicidade, donde vier. Seja ela pastora, médica ou astronauta. Seja ela a mais inteligente ou até um pouco desligada. Queira artes ou ciência. Não queira nada disso. Queira ser apenas mãe. Ponto. Que saiba viver e ame fazê-lo. Que cresça integra. E feliz. Atingir a felicidade e viver na sua plenitude é o que uma mãe mais deve querer para um filho. Pelo menos para mim, é.
Hoje já chorei. Por ela. Que (a maior parte das vezes) só me faz sorrir. A minha menina doce. Que escreve com as duas mãos, com a mesma facilidade. Que desenha "pespectivas" (perspectivas). Que dança feliz. Que nos diz a toda a hora que nos ama. Que diz que quando crescer vai escrever e pintar. Mas que é demasiado tímida. Que se orgulha de já ter 4 anos. E convence todos que daqui a três dias vai fazer 5. Que ainda guia os acontecimentos da vida dela pelas estações do ano. Que é diferente mas não assim tanto.

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6 Comments:

At 11/9/09 14:54, Blogger Pat said...

Ei!!! Amiga, pssttt!!! Foi bom teres desabafado, agora deixa os dias correr e vais aprender a "relaxar" com o crescimento das tuas filhas. REvi-me no teu texto e tenho que te agradecer pela partilha e a coragem em tocares nestes temas.

bjinho

Pat

 
At 11/9/09 22:58, Blogger Unknown said...

Estou sem palavras, mas não podia deixar de comentar, porque a medida que foi lendo o texto as lagrimas teimaram em cair, embora até hoje não ter qualquer queixa das educadoras dos meus filhos, este ano o Roo tem uma educadora nova e noto que ele mudou chora a porta da sala e não vai com a mesma alegria para a creche, e as vezes dou comigo a pensar o que se passará lá para ele mudar, para não ter mesma alegria e vontade de ir para a escola. Obrigado pela partilha serve para outras mães tal como eu terem atenção a outros pormenores tal como os desenhos que nem sempre damos importância, espero sinceramente que a esta hora já estejas melhor.Força

 
At 11/9/09 23:44, Anonymous Louise Hazel said...

Clap, Clap, Clap!!!!

Palmas para ti.

É só o que consigo dizer.

Adorei!!!

 
At 12/9/09 21:57, Blogger Rita said...

Eu fico estupefacta com as coisas que leio por vezes... imatura???? Ela tem 4 anos... QUATRO!
A minha filha desenha mal que só visto (sai ao paizinho e à mãezinha), não se interessa muito por pintar, não sabe as letras à excepção da letra dela, sabe os algarismos quase todos mas às vezes troca-os... e depois? É tímida sim, como eu e o pai éramos também. Isso não a torna imatura.
Elas têm SÓ 4 anos Patrícia... relax! E essa educadora que faça um upgrade! (Ela por acaso tem filhos???)
Bjs

 
At 14/9/09 23:17, Blogger Helena said...

eu também chorei, acredita. não por ter passado pelo mesmo mas por me aperceber que poderei via a passar. A Adriana foi agora para a escolinha, pela primeira vez, e apesar de ter ficado bem na sexta-feira, dia da apresentação e hoje que já foi mais a sério, quando a fui buscar disseram-me que era muito sossegadinha e caladinha. Ela também é muito timida quando está fora do ambiente dela...nem quero pensar...
uma beijoca muito grande

 
At 15/9/09 12:12, Blogger Cláudia said...

Eu confesso que não percebo qual é a pressa...porque é que as crianças tyêm que ser pequenos adultos...até se nota na forma de vestir...as crianças são crianças e ponto final...
se na escola são introvertidos...qual é o problema?
Eu sempre fui e no entanto sou uma adulta muito bem resolvida, não tenho jeito nenhum com trabalhos manuais mas isso não interessa nada.

A Mariana é uma criança que precisa ganhar confiança, eu não vi como é que ela agiu comigo todas as vezes que ela me viu?
Primeiro estranhou-me e depois "entranhou-se" :)

Deixem os miudos crescer...deixem-nos ser crianças!

:)

 

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